Chaucer- Os Contos da Cantuária.

Rodrigo Naimayer

Chaucer- Os Contos da Cantuária.

Olá, eu sou o professor Rodrigo Naimayer dos Santos. Sou bacharel em História e colaborador do Instituto Hugo de São Vitor e pretendo falar agora sobre Geofrey Chaucer e do papel e relevância dele para uma leitura católica da literatura e também da literatura inglesa em si. Algumas pessoas, ao longo do tempo, foram cada vez mais prestigiando essa grande literatura, que é a literatura da Inglaterra. Porém, muitas vezes, sem saber quais são as origens. O que colocou a literatura inglesa dentro desse hall da grande literatura.

Começarei falando sobre a vida de Geofrey Chaucer. Para mim, é um grande ponto de partida, partida pois, para falar de qualquer autor, é importante falar das origens dessa pessoa, em qual local ela se encontra e em que circunstâncias.

Geofry Chaucer nasce praticamente no final da primeira metade do século XIV. É um período de profundas mudanças e muitas crises, tanto na Inglaterra, quanto na Europa continental. Na faculdade, nós brincávamos que “depois da peste e da fome, o pau come”, os três quadros dessa Europa medieval: peste, fome e guerra. Chaucer nasce em 1342 e seis anos depois nós temos o grande surto da dita peste negra, que dizimou uma população enorme da Europa, incluindo da Inglaterra. Vai ter uma nova categoria social que surge por causa da peste negra, em vista das grandes propriedades que ficaram, então, desabitadas e foram apropriadas pelas famílias sobreviventes de alguma forma, e essas famílias foram gradualmente se libertando do jugo feudal.

Ou seja, eu tenho esse cara, que vai ser apresentado, eu tenho um representante dele nessa obra que vamos ver de Chaucer, que é “Os contos de Cantuária”. Eu tenho um representante dessa nova categoria, que não é um nobre, não é um lord, não é um land lord, não é um senhor feudal e, ao mesmo tempo, não é um servo da gleba. É um homem livre. E esses sujeitos depois vão ser em algum grau a base daquilo que vai se tornar depois a dita câmara dos comuns do parlamento inglês. É esta a divisão. O Parlamento inglês tem os nobres, que é a câmara dos Lords, e a câmara dos comuns, que são os eleitos. A peste, evidentemente, causa não só uma mudança da estrutura social, como uma mudança na maneira de imaginar a morte dentro da sociedade Européia (incluindo na sociedade inglesa).

De alguma forma a morte acaba ganhando contornos meio macabros pelo número de pessoas que acabam falecendo, em uma quantidade muito grande, muito rapidamente, de maneira que muitas vezes até o sepultamento dessas pessoas tem que acontecer de maneira desprovida daqueles elementos rituais que acabam levando a um processo de aceitação da morte, e assim por diante. Alguns historiadores até conjecturam que a cor negra ou escura relacionada à morte, poderia estar relacionada a esses eventos, em vista das pústulas negras que surgiam no corpo das pessoas que morriam. Isso é curioso, porque dentro de um dos contos que estão presentes no livro “Os contos de Cantuária”, a morte é personificada, não usando negro, mas branco. Então, a gente percebe que não é em todo tempo que no Mundo Ocidental que essa figura da morte como ceifador, vestido de manto negro, sempre foi a figura da morte no imaginário das pessoas. Também, um outro elemento que começa a criar um clima diferenciado, negativamente na Europa, é a questão da guerra, agora em uma proporção que envolve diretamente a Inglaterra, junto com outro território bastante relevante que é a França.

Então, a gente tem, justamente, muito próximo de Chaucer, o surgimento deste conflito que é a Guerra dos Cem Anos. Algumas pessoas falam da Guerra dos Cem Anos, e gente passa por essa matéria no colégio, mas é um conflito que aconteceu em vista da tentativa da Inglaterra de defender seus direitos comerciais no continente, e em algum grau com a tentativa de recuperação do território que antigamente os reis ingleses tinham no continente. Então, assim teremos o começo da Guerra dos Cem Anos. Chaucer também participa disso.

E, por fim, a questão da fome relacionado muitas vezes ao aumento de impostos e também ao fato de que uma vez que eu tenho um número muito menor de pessoas lavrando e colhendo nos campos, eu vou ter então certos períodos de fome, já que de alguma forma a fome é um fenômeno que acontece na Europa até um determinado momento (a gente tem sempre o homem europeu com esse fantasma da fome lhe assombrando). Isto é algo que está recorrente, mas de alguma forma, neste período, parece que recrudesce. A gente vai perceber isso, entre outras coisas, com a grande rebelião dos camponeses, em 1381, que está relacionada também às questões de taxação e a questão da carestia e assim por diante.

Saindo da Inglaterra, nós vamos perceber também que a Europa se encontra em uma contusão espiritual, talvez aí a gente se aproxime mais do tema do nosso congresso, que é de literatura católica. Nós passamos já pelo auge do período tomista e nós temos alguns problemas políticos muito sérios acontecendo dentro da estrutura hierárquica da Igreja Católica. Entre eles, o Grande Cisma do Ocidente e, anterior ao cisma do ocidente, aquilo que foi chamado por muitos de “o exílio de Avinhão”. Recordando um pouco o que é o exílio de Avinhão, é o momento em que, pressionado pelo Rei francês, propriamente o Rei Felipe, o Belo, o Papa acaba transferindo a sede de Roma, sob o pretexto de que ali estaria mais próximo da possibilidade da proteção temporal do rei mais proeminente da Europa neste período. Então, ele sai de Roma e vai para Avinhão.

O que fica, de fato, parecendo para toda Europa? Que, de alguma forma, o Papa havia se tornado um fantoche do rei francês e que agora as nações cristãs da Europa não podem mais apelar ao Papa com a segurança de que serão julgados com equidade e justiça junto às suas requisições. Por que? Porque o Papa está no território do rei francês. Para muitos, aquilo é um elemento que coloca a desconfiança na proeminência da justiça dos julgamentos do Papado. Essa crise vai desembocar no que é o cisma do ocidente, que é um determinado momento em que não se sabe ao certo, quem é o verdadeiro pontífice. Vale lembrar que o acesso à informação não era algo tão tranquilo e fácil de se ter como hoje em dia onde é muito fácil decidir quem é o verdadeiro pontífice. Naquele período, não. De maneira que temos inclusive santos que estão ao lado de um pontífice, de um papa, que depois a história vai apresentar como um antipapa, ou seja, um papa que se opõe ao papa verdadeiro. Então, nós temos essa contusão em toda a Europa.

Tem um dado, essa ferida na unidade, e isso quem tem um pouco mais de conhecimento acerca do papel da unidade dentro do corpo da cristandade, ou da religião, até para quem não tem tanto contato com isso até esse momento, basta pensar o que acontece logo depois da reforma protestante. Nós temos uma série de comunidades eclesiais baseadas no Cristianismo e, a partir dessas comunidades eclesiais, novas vão surgindo.

Hoje, nós temos uma série de denominações protestantes, evangélicas, neopentecostais e assim por diante. Porque, de fato, não existe esse centro de autoridade de onde possa se dizer: “aqui está a referência.”. Por exemplo, às vezes, em uma comunidade evangélica, eu tenho um pastor e esse pastor tem uma determinada interpretação do evangelho, então, esse sujeito vai rumar para aquela denominação que vai mais para o seu senso. “Eu concordo mais com essa interpretação do Evangelho, então vou ser dessa congregação aqui”. Assembleia de Deus, Deus é Amor, Igreja Universal, e assim por diante. Para os protestantes, via de regra, não tem esse senso tão forte de unidade. Para o catolicismo esse senso de unidade sempre foi fundamental para manter as coisas no eixo, meio que como uma crença comum.

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